segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Reducionismo, reducionismo trivial...

Incendiado ao ficar preso em uma barricada, ou ateado fogo
via coquetel molotov por "baderneiros"? Ou nem uma coisa
e nem outra, mas algo mais complexo?
fonte: G1
Rápido: o que os protestos contra a Copa do Mundo, os Blac Blocks, as ações do MPL, os atentados no Egito, os movimentos feministas, os rolezinhos e as manifestações contra o governo ucraniano tem em comum? Não, não são as causas - cada uma tem motivações diferentes (embora semi-relacionadas por terem muito a ver com representatividade); Também não são os métodos, a não ser que você esteja sugerindo que o MPL faz atentados a bomba, e que o Ansar Beit al-Maqdis estava gritando palavras de ordem e jogando ovos nos prédios da polícia egípcia. 

Não, a resposta é algo mais simples: a maneira como em todos estes casos, o conflito e seus atores são reduzidos no discurso popular a uma versão simplista - e que muitas vezes não tem nada a ver com o factual. E assim qualquer possibilidade de debate se perde, em meio a uma compreensão que mal pode ser reconhecida como tal. Em poucas palavras, movimentos e fenômenos complexos são reduzidos a clichês e frases e efeito... Da mesma maneira, os membros destes grupos são reduzidos ao grupo - e o grupo é reduzido às ações de seus piores. 

Um atentado movido ao ódio pelo ódio, oposição a um governo
ilegítimo, uma combinação das duas coisas, ou nada disso?
fonte: BBC
Rapidamente, o Passe Livre passa de um grupo com uma pauta bem definida para "comunistas que não sabem o que querem", quando não mentirosamente reduzidos a "playboys egoístas que ameaçam a polícia"; as contradições entre a modernidade e a tradição no Egito são ignoradas, e ao invés de se olhar para os conflitos resultantes e o que está por trás deles, se reduz a "terroristas que odeiam porque odeiam"; Os jovens protestando contra a copa são reduzidos a "baderneiros" (ou a "heróis em prol da saúde e da educação", apesar do investimento de R$ 28 bilhões ao longo dos últimos cinco anos - ou R$5.6 bi/ano - não ser nada perto do orçamento de educação -R$ 88.7 bilhões - e saúde - R$ 93 bilhões - para 2013 apenas. Além disso, os ditos R$ 28 bilhões são uma combinação de fundos privados e federais, e destes R$ 17 são em infraestrutura e aeroportos. Mas eu digredi, e não discordo que o gasto seja absurdo); e os manifestantes da Ucrânia são só "vândalos" (ou novamente, heróis contra a "ditadura comunista", por pessoas que ainda não saíram da guerra fria), ignorando o histórico de corrupção do governo Ucraniano e o radicalismo conservador de grupos de oposição.  

MPL: baderneiros comunistas, vândalos que ameaçam a polícia
entre outros insultos usados por quem se recusa a ouvi-los.
Para não mencionar o quão intenso é este fenômeno com relação aos Blac Blocks - como as ideias políticas que guiam esses jovens anarquistas e predispostos a violência contra os símbolos das instituições que vêem como inimigo se perdem em meio a cacofonia de acusações mútuas por parte da esquerda e da direita, ambos acusando a outra de ser responsável pelos "vândalos", e ambas negando responsabilidade; Ou a ainda pior relação com as feministas e os "rolezeiros", onde o reducionismo e a trivialização passa de insultos "leves" (como reduzir a posição do MPL à "esquerdopatia", esse termo tão vejistíco) para uma enxurrada de insultos misóginos, ameaças de violência sexual e assassinato de caráter (a mais clássica: "A cura pra feminismo é uma boa trepada" e outras aberrações), ou à ofensas racistas e acusações de criminalidade, por parte de quem nega que haja um caráter racial na questão.

É fácil reprimir e invalidar movimentos sociais, assim como é fácil manter o status quo frente a uma ameaça quando se reduz toda e qualquer oposição à um espantalho, causado por "gente ruim", ou por "baderneiros". Quando se reduz o terrorismo ao ódio pelo ódio, é fácil justificar o uso de violência contra "eles" - quando se demoniza a oposição - mesmo uma que já escalou o conflito para o uso da violência - com um reducionismo tão tacanho (e no caso do Egito, tão mentiroso, ao associar a Irmandade Muçulmana com um grupo repudiado pela mesma) é fácil justificar a violência contra o "outro". Não me surpreende, por exemplo, que a maneira como os Blac Blocks são tratados como essa coisa monolítica e perversa seja usada de justificativa para prisões e agressões contra manifestantes em geral. Ou se o atentado do al-Maqdis seja usado pelos militares egípcios como desculpa para perseguir muçulmanos ortodoxos. 

Vale lembrar que esse reducionismo foi usado com maestria por governos autoritários e por movimentos extremistas ao longo da história; Trayvon Martin foi reduzido a um "Thug" por racistas na Florida; Hitler reduziu Judeus a uma caricatura grotesca, responsável por todos os males da Alemanha; Joseph McCarthy promoveu uma "caça as bruxas" no governo americano, atrás de um espantalho comunista; Stalin e Mao justificaram a perseguição aos "capitalistas" com distorções e simplificações. Agora, no Brasil, vemos certos formadores de opinião clamando pela violência contra movimentos sociais, enquanto acusam - sem base - esses movimentos de buscarem um "golpe comunista". Vêm a questão... para que fim esse discurso?.

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