sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Até que ponto vai o ódio?

Em fevereiro, Revoltados ON Line postou calúnias contra
o imigrante haitiano Auguste Lubain, e insinuou que os caribenhos
estivessem no país para "impor a ditadura". 
A onda de ódio contra Haitianos cruzou a linha que eu temia: neste sábado, movido pelo discurso xenófobo que se tornou vigente, um homem abriu fogo contra um grupo de Haitianos na capital paulista. O atentado deixou quatro feridos e um morto. Este é o segundo incidente de violência armada contra imigrantes haitianos desde o início do ano. Em junho, um haitiano foi baleado no estômago por dois homens em uma moto na cidade de Rio Grande, RS. 

Enquanto isso, o discurso contra os imigrantes se torna cada vez mais comum: uma semana antes do ataque ao haitiano em Rio Grande, um membro do grupo "Revoltados ON Line" gravou um vídeo ameaçando e assediando um frentista haitiano. Antes disso, o mesmo grupo havia incentivado a agressão aos nativos do país caribenho com alegações de que estes seriam "criminosos" e que seriam parte de uma "conspiração comunista". 

Ontem, na câmara dos vereadores de Joinville, foi realizada uma audiência pública para tratar da questão migrante na cidade. Em um pequeno, mas extremamente importante passo, foi tomada a decisão de criar uma comissão permanente de apoio ao Imigrante. No entanto, enquanto a cidade avança nesse aspecto, reações negativas não são raras. Na página que convocava para a audiência, um pequeno grupo se dedicou ao discurso de ódio contra negros - sejam haitianos ou não. 

Discurso postado em página de evento sobre a imigração
haitiana em Joinville.
Em redes sociais, os discursos contra os imigrantes vão desde o compreensível mas errôneo "acho que deveriam cuidar dos nossos antes de trazer imigrantes" até alegações de que "haitianos são estupradores" e "porque trazer esses 'parasitas' para o Brasil". Outro discurso comum é que os imigrantes vieram ao país para "roubar as eleições" - tese reproduzida por vários "formadores de opinião". O mesmo vitriol contra a imigração de países caribenhos só é vista com imigrantes africanos - quanto aos imigrantes europeus, não há um pio. 

Em casos mais preocupantes, que demonstravam o grau de ignorância dos xenófobos nacionais, houve o pânico a respeito de imigrantes haitianos trazerem Ebola ao país (a doença havia ressurgido na África Subsaariana); que houvessem membros do Boko Haram (um grupo extremista Somali) entre os migrantes do país caribenho; e mais recente, que o Estado Islâmico viesse ao Brasil via Haiti - um país de população 98% católica, e longe do território do EI, entre a Síria e o Iraque. 

O discurso contra imigrantes é extremamente atraente para "atiçar os ânimos" da população. Ele oferece uma explicação simples e primária para todos os males da nação, de desemprego a criminalidade, sem se preocupar com análise aprofundada ou evidências. Apesar do progresso que foi feito no tratamento de minorias, migrantes de países pobres ainda são "alvos válidos" para o preconceito. Foi esse discurso que catapultou o magnata americano Donald Trump nas pesquisas de intenção de voto, ao afirmar sem pudor que os imigrantes mexicanos eram "traficantes e estupradores". 

Curiosamente, os imigrantes em outros países são usados como justificativa para a xenofobia. Nos EUA e no Brasil, o discurso xenófobo contra imigrantes de países Árabes é pautado na tese (sem fundamento) de que "múltiplas cidades europeias" foram tomadas pelo Islã. A rede de notícias americana Fox News se tornou alvo de piadas depois de afirmar que a cidade britânica de Birmingham era "100% islâmica" e se tornara uma "zona de acesso proibido" para infiéis. No Reino Unido, grupos como Britain First e Ukip, por sua vez, usam a França como argumento. Em Paris, o argumento é Berlim. E assim vai. 

E no meio desse mar de insanidade, a voz da razão vem de uma jornalista alemã, Anja Rechske, que causou polêmica esta semana após clamar por um "levante das pessoas decentes". Embora esse tipo de frase seja comum por parte dos xenófobos, que se definem como "pessoas de bem", o que Anja pediu foi o contrário: um levante de quem não tolera esse discurso racista e intolerante, para que exponham e condenem seus autores. Que o discurso de ódio não seja mais tolerado. Que os escribas do ódio entendam que a sociedade não mais aceitaria isso. 


Segundo a jornalista da ARD, até alguns anos atrás as pessoas que mantinham esse pensamento pequeno tinham vergonha, e se escondiam por trás de pseudônimos. Mas agora, tem não apenas mostrado a cara, sem medo de parecerem racistas, como também tem ganhado "likes" e respeito por seu discurso de ódio. Rechske conta com grande apoio da população alemã - mas enfrenta ataques de quem vê seu pedido por ação contra o racismo como uma afronta a liberdade de expressão. Ironicamente, querem que ela seja demitida pro emitir sua opinião.

Qual linha terá que ser cruzada antes que se tomem medidas sérias contra esse tipo de ódio, eu me pergunto? Mesquitas foram incendiadas em nome da ideia de que todo muçulmano é terrorista; Sinagogas foram incendiadas como resultado de discursos neonazistas. Em nome da xenofobia, imigrantes são agredidos, espancados e mortos. Até quando?