quinta-feira, 27 de junho de 2013

Os protestos voltaram ao normal?

Não participei das passeatas desta quarta-feira. Confesso, a progressiva "coxinhização" dos movimentos me deixou demasiado frustrado para conseguir juntar-me a mobilização. Temia que novamente me visse em meio a gritos de "Fora Dilma", "Abaixo a PEC 37" (que caiu nesta terça-feira), "redução da maioridade penal", "Não à corrupção" e a intensa cantoria patriótica que suplantou a luta do Movimento Passe Livre desde aquela quinta-feira fatídica há duas semanas.

Mas acompanhando de vista a manifestação aqui de Joinville junto com a minha namorada, uma surpresa mais do que agradável: vendo a passagem da manifestação do MPL, poucos sinais das pautas típicas da direita ou da alienação política que marcou a semana anterior. Apenas alguns perdidos "Podia estar matando, podia estar roubando, mas os políticos fizeram primeiro" (que carece de um problema a ser combatido) e um cartaz sobre algo ligado a "urna eletrônica ser fraude eleitoral", a velha pauta que surge todo período eleitoral - e que faz pouco sentido: implantada durante o regime de FHC, se a função da urna fosse roubar a eleição, jamais que Lula chegaria ao poder (ao menos que o sujeito insinuasse que era uma conspiração secreta do PT dentro do governo do PSDB - ou que durante o governo FHC a urna era honesta, mas depois passou a não ser, mas não vou me meter com teorias da conspiração aqui).

De resto, era apenas o MPL e a esquerda que sempre o apoiara - nada dos gritos de "sem partido", nada da cantoria do hino nacional, de "eu sou brasileiro com muito orgulho", das máscaras de Guy Fawkes e daquele estranho clima de carnaval (ou marcha cívica) que marcou a semana anterior. Ao invés de uma massa de 12 mil pessoas com uma miríade de pautas enfraquecidas, uma única pauta dando as caras com força. E que chegou ao ponto de ocupar o terminal urbano (pulando a catraca, e não na travessia com cara de marcha cívica da semana passada). Algo que não era visto desde que tivemos a população "se solidarizando" com os jovens do MPL depois que estes apanharam - e muito - naquela fatídica quinta-feira marcada pela violência contra tudo e todos por parte da PM de São Paulo.

Teríamos aí o retorno dos verdadeiros protestos? Pautas claras e pessoas politizadas nas ruas, ao invés da aura vaga e dos gritos fascistas de "sem partido" e o culto fervoroso a bandeira nacional - que culminaram no ódio violento às esquerdas, nas agressões contra militantes partidários, e em seu ponto máximo, casos como o incendiamento de bandeiras estaduais? Uma coisa é certa: a esquerda conseguiu virar o jogo e voltar a ter presença de fato nas ruas. E isso é uma coisa a ser admirada.


O caos próximo ao Mineirão
Infelizmente, a relativa tranquilidade vista em Joinville não foi sentida no resto do país: em Minas Gerais, os protestos foram marcados pela ainda forte presença de vândalos, com direito até a explosivos improvisados; Em Teresina, um rapaz de 15 foi esfaqueado durante a manifestação; No Rio de Janeiro, a Policia Militar recorreu a bombas de efeito moral para liberar as rodovias; E no Distrito Federal a manifestação terminou com 27 presos, invasão da câmara dos deputados, e uso de mais bombas de efeito moral. Ainda estamos em um estado de tensão no país.

Com as significativas vitórias de algumas das pautas que poderiam levar a perda de forças das centenas de milhares (1,5 milhão, da última vez que acompanhei) que foram as ruas, alguns já se sentem vitoriosos: tivemos a queda da PEC 37 (embora nem tudo nela fosse ruim - mas a maior parte de fato era); A corrupção passará a ser crime hediondo (embora ninguém vá ser punido ainda pois a lei não pode retroagir...); Teremos uma reforma política considerável (mas quem a pedia agora diz que isso é golpe... e que não sabemos como será); tivemos uma proposta aprovada para reduzir o transporte coletivo em todo o país (se as empresas não se aproveitarem); e foram aprovados mais investimentos na saúde e na educação. Tudo isso é muito positivo - e desarma parte daquela sarna golpista que a direita mais radical insistia em coçar. E para fechar a virada, o ídolo da massa reacionária, Joaquim Barbosa, declarou seu apoio ao plano da Presidente de fazer a reforma por plebiscito. Uma bomba a menos, possivelmente.

Manifestantes ocupam ônibus "cedidos" em Joinville
Mas como demonstra o blogueiro Marcelo Rubens Paiva, do Estadão, isso não significa que a direita abandonou a tentativa de cooptar as manifestações - ou sequer que ela tenha aceito a presença da esquerda nas ruas. Ainda há esforço nas redes sociais para se expulsar violentamente a esquerda e os movimentos sociais. Mesmo nas manifestações organizadas por grupos como o MPL, são visíveis as tentativas de grupos como o Liber de sequestrar a movimentação para defender pautas completamente contrárias aos organizadores - como a privatização do transporte coletivo.

Ainda temos gente propondo que se expulsem "os vermelhos" das ruas. A velha publicação reacionária ainda tenta acusar os partidos de esquerda de serem oportunistas e de tentarem "desacreditar a movimentação do povo" - quem entende sabe que publicação é. Ainda existe nas redes sociais a sugestão da queima das bandeiras partidárias, mas com menos reconhecimento da população em geral - felizmente, parece que voltamos a ter um dialogo político saudável nas ruas.

O temor de um golpe foi reduzido - talvez até exposto como ridículo -  mas ainda não estamos exatamente livres. Mesmo com o relaxamento da onda, e a redução nos números dos direitistas tentando se apoderar das manifestações da esquerda, ainda vivemos uma situação tensa. E é claro, a retomada da esquerda foi em Joinville - no resto do país as coisas não foram tão tranquilas. Os números tem caído. As PMs tem retomado a repressão, e ainda é cedo para dizer se as medidas propostas pela presidente surtirão efeito em acalmar a população. Por ora, a coisa mais inteligente a se fazer é esperar para ver.

E por favor: não façam mais isso. 
Quanto a direita: se querem se manifestar, sintam-se a vontade. O problema não é a expressão de suas vozes, mas sim as tentativas de se apoderarem de movimentos ligados a esquerda como sendo seus. Organizem suas próprias passeatas, ao invés de tentarem comandar uma do MPL, do grupo Mães de Maio, do Grupo Gay da Bahia, ou qualquer que seja o movimento social. Isso não é uma ameaça: é um convite para que demonstrem ao país o que querem.

Assumam seu posicionamento político-ideológico, ao invés de gritar "sem partido" a cada bandeira vermelha encontrada - enquanto continuam a ignorar as faixas em apoio à "volta dos militares", pedindo "o fim da esquerda", ou clamando por Barbosa para presidente: todas essas pautas tem sim partido - toda pauta o tem. Se querem ir a luta, que lutem! Mas façam isso de maneira honesta, sem tomar a luta alheia para si e acusar aqueles que lutavam há anos de serem oportunistas. Se querem mostrar como suas bandeiras são a retidão e a integridade, demonstrem isso na prática.

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