sexta-feira, 14 de junho de 2013

O problema é a imprensa, coronel?

Após o horror da repressão digna dos tempos da ditadura que se viu nesta quinta-feira, era de se esperar ao menos alguns comentários simbólicos por parte das "otoridades" (pois sua atuação demonstra que não merecem mais o português correto). E não surpreendentemente, tivemos o prefeito Fernando Hadad se esquivando da situação, alegando que "a polícia não seguiu os protocolos" - e mantendo que a Prefeitura não irá repensar o reajuste; o governador Geraldo Alckmin se atendo a dizer que "abusos serão investigados " e que os manifestantes deixaram um "rastro de destruição"; e o eterno baluarte do reacionarismo, o "jornalista" Reinaldo Azevedo, defendendo que se enquadre os militantes do passe livre como "terroristas".

Mas nada disso me parece tão representativo quanto os comentários do vereador Paulo Telhada (PSDB): após o confronto entre policiais e manifestantes que terminou com mais de 200 presos, sete jornalistas da Folha de São Paulo feridos, prisões por "posse de vinagre", e transeuntes atingidos por granadas de gás... Telhada criticou a atuação da imprensa. "O Brasil está a beira do caos e ninguém se apercebe", afirma o ex-coronel da Rota - o Bope de São Paulo, infame pelo número de "trocas de tiro a queima roupa" que já cometeu, vide o livro Rota 66 - e completa: "Tem dias que tenho vergonha da nossa sociedade".

Isso é digno de vergonha. Fonte: Diego Zanchetta, Estadão
Vergonha, coronel? Foi a imprensa e a sociedade que abriram fogo contra Jornalistas? Que espancou um repórter? Foi a imprensa que foi flagrada quebrando o vidro da própria viatura, para ter argumentos que justificassem a violência? Imagens como as contidas no Tumblr Feridos no Protesto em São Paulo são fruto "da imprensa"? Sim, São Paulo - e arrisco a me dizer, todo o país - vivem em uma situação de caos. Um caos fruto do descaso de governantes, da ganância das elites, e de uma polícia que quando não é despreparada, se demonstra sádica como ocorreu nesta quinta-feira.


Pela defesa de objetos inanimados, estamos defendendo a violência
contra pessoas. É isso que queremos para o Brasil?
E o fascismo inerente nas ações da Polícia Militar de São Paulo tem raízes de longa data: basta uma olhada no site da corporação para descobrir os pontos de "orgulho" na história da PM, homenageados em seu brasão de armas, para achar coisas como estas: "9ª estrela -1910, revolta do marinheiro João Candido" (vulgo: revolta da chibata), "10ª estrela - 1917, Greve operária" e a mais alarmante, 18ª estrela - 1964, Revolução de Março. Uma corporação "para defesa da população" que tem como marcas de honra atos atrozes de repressão e um golpe de estado. Nada mais assustador que isso.

Tenho vergonha, coronel Telhada: vergonha de dividir minha espécie com pessoas como o senhor, que vêm com gosto o absurdo que foi visto ontem. Que em toda a crítica que seu cérebro conseguiu elaborar, não percebeu em ponto algum que a atuação da PM era condenável. Tenho vergonha de um país onde se cogita que se enquadrem movimentos sociais no crime de formação de quadrilha, quando não se sugere tratá-los como terroristas: tenho vergonha de cada coisa que você e os cães de guarda de um estado corrupto vem com orgulho.

Mas nem tudo no aftermath  de mais uma noite de conflitos (certamente não a última) foi ruim: apesar de mais de 230 presos, cerca de 100 feridos - embora a PM, em um flagrante de falsidade, alegue que foram apenas 12, todos policiais - (e até agora felizmente nenhum morto que se saiba), as opiniões começam a mudar. Após os seus jornalistas sentirem na pele a violência da polícia, Folha de São Paulo e Estadão ao menos se posicionaram contra a violência - ao invés de sutilmente clamar por ela como fizeram na terça-feira. E mesmo sem o apoio do Ministro da Justiça, que só fez criticas aos manifestantes, agora tem-se o apoio da ministra de relações institucionais, Ideli Salvatti, que está cobrando a desoneração dos transportes coletivos em todo o país. Algo de bom tinha que vir da luta.

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