quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Taliban e Paquistão iniciam conversas de paz; e agora?

Fonte: Reuters
O perene conflito entre os militantes fundamentalistas do Taliban e o governo paquistanês pode estar próximo do fim. Após vários adiamentos, desentendimentos e dúvidas crescentes, as negociações de paz com o grupo militante islâmico finalmente começaram nesta quinta feira. A pergunta que fica é... e agora?

A insurgência dos Talibans contra o governo paquistanês tem levado a conflitos violentos desde 1994; visando derrubar o governo democrático - porém islâmico, e que ainda tem absurdos como penas capitais por "Blasfêmia" - do Paquistão para instalar uma teocracia em seu lugar. Tentativas anteriores de diálogo foram legadas ao fracasso quando os milicianos usaram da trégua para reforçar a guerrilha e recuperar forças. Desta vez, afirma o governo paquistanês, as coisas parecem diferentes - mas será que são?

É difícil acreditar na sinceridade de conversas de paz quando estas vêm de um grupo que tem realizado atentados quase diários no país. Para Bilawal Bhutto Zardari, filho da ex-primeira ministra Benazir Bhutto - assassinada em um atentado da Al Qaeda em 2007 - o governo de Nawaz Sharif sofre de "síndrome de Estocolmo", e "precisa parar de dar desculpas para não usar de força militar contra o Taliban". 

Ao mesmo tempo em que discute a paz com o Taliban, no entanto, os dois lados do conflito tem escalado as agressões. Enquanto o Taliban realizou vários atentados contra forças de segurança desde o início do ano, o governo Paquistanês enviou a força aérea para bombardear esconderijos dos extremistas na região do Waziristão do Norte, próximo a fronteira com o Afeganistão - e rumores de uma ofensiva por terra tem circulado pelo governo, segundo a Reuters.

A tira é sobre o Yemen, mas se aplica igualmente ao
Paquistão.
Para auxiliar nas conversas de paz, o governo dos EUA cessou temporariamente os ataques com Drones no país; um gesto simbólico não muito digno de confiança, em vista dos 28 ataques realizados no ano passado apenas - e que deixaram 137 mortos (oficialmente, 123 talibans e 14 civis) - ou da prática de "signature strikes", em que não há confirmação do alvo, apenas suspeita da presença de extremistas no local (e estes são frequentemente seguidos por um segundo ataque quando há tentativa de apoio aos feridos).

Esse não é um problema que possa ser resolvido facilmente. Mesmo que as conversas de paz sejam bem sucedidas, ainda há o problema da militância Taliban não ser formalmente estruturada - ou seja: enquanto as lideranças envolvidas no diálogo possam ser convencidas a cessar a violência, outros líderes podem se erguer em seu lugar, ou outros movimentos podem desmembrar-se do Taliban paquistanês. Da mesma maneira, não se pode recorrer apenas ao diálogo frente a atentados e ataques suicidas.


Ao mesmo tempo, não é a violência que vá cessar a atividade dos talibans; embora a resposta mais simplória diga que a raiz do problema é "o Islã", como se fosse algo monolítico e tão simples, o problema é mais embaixo. Tentar resolver o problema através da repressão e da violência só vai levar os talibans a se sentirem justificados em seus atos - e aqueles que não tomaram um lado, frente ao conflito, podem pender para o lado do Taliban, ao ver a violência ser institucionalizada. Ainda mais onde a única presença do Estado se dá na forma das forças armadas, de bombardeios e ataques de artilharia - onde a segurança e a "justiça" são dadas pelos milicianos extremistas do Taliban, e o governo paquistanês parece inexistir - marcas clássicas de um estado fragilizado.

Radicalismo não nasce do nada; como demonstrado com grupos radicais políticos, ideológicos ou de gênero, o fanatismo é um processo complicado, que advém de uma sensação de exclusão e não representação no todo; No quadro islâmico, esse processo frequentemente nasce de um conflito com os desafios apresentados pela modernidade e o abandono da tradição; enquanto alguns países se viram para o secularismo como solução - vide Turquia até tempos recentes - ou para o tradicionalismo, como a Arábia Saudita, em outros casos. No caso da região do Afeganistão e do norte Paquistanês, a sensação de alienação social levou a formação de grupos fundamentalistas; Não contentes em se virar para a tradição, buscam retornar a um passado ideal onde "a moral e os bons costumes" eram primordiais - e isso é difícil de se combater, especialmente a força.

Cenas como essa podem estar perto do fim - ou podem se tornar
ainda mais comuns.
De qualquer maneira, o Paquistão se encontra frente a um grande desafio, e um futuro nebuloso. Um conflito de duas décadas pode estar perto do fim; o inimigo perpétuo pode se render e cessar a violência, e o país pode estar finalmente caminhando para a paz. Ou pode ser tudo um engodo, uma jogada do Taliban para recuperar forças, ou do governo para encurralar os milicianos. Ou nem uma coisa, e nem outra: as conversas de paz podem dar certo, mas aqueles fundamentalistas que não concordam com a paz podem continuar a guerrilha. Ou o Taliban pode cessar o conflito, e uma mudança de governo pode retomar a repressão contra o grupo. Apenas o futuro pode dizer - e esse futuro é cada vez mais difícil de ser estimado. 

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