terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Paradoxos Critica: The LEGO Movie: Uma ode a criatividade

Personagens marcantes com um gostinho de infância.
O mundo nas mãos de um tirano, uma população complacente e obediente, alheia a opressão que a cerca, e a unica coisa que pode nos salvar é o especial, o escolhido; é com essa premissa "originalíssima" que LEGO Movie começa - e a maestria com a qual lida com a mais clichê de todas as jornadas heroicas é um atestado a criatividade que o filme (e os brinquedos) celebram. Enquanto outros filmes de marcas de brinquedos tentaram apelar para uma pretensa "seriedade" que resultou em níveis bélicos de estupidez, a direção e roteiro da dupla Phil Lord e Christopher Miller assume sem vergonha aquele olhar inocente, onde nenhuma ideia é idiota demais (salvo o sofá beliche!), ninguém é "um ninguém" e onde as instruções não são ordens, mas sugestões: faça o que vem em sua mente - e nada poderia ser mais LEGO que isso. 

ESPAÇONAVE!
Com uma trama sólida - boba, sim, mas sólida -, sacadas geniais, animação belíssima e atuações inspiradas, é difícil dizer o que é melhor em LEGO Movie; se são as referências infindáveis a história da LEGO ("e mais um monte de mundos que a gente não menciona"); se as piadas tolas, mas hilárias, dignas de um filme do trio Zucker, Abrams, Zucker; se são os personagens, como o Batman impagável de Will Arnet (deliciosamente babaca, arrogante e "durão"), o mago Vitruvius de Morgan Freeman (genial, ou epicamente idiota? você decide), o astronauta de 1980 e tantos de Charlie Day (ESPAÇONAVE!), o Mau Policial de Liam Neeson (e seu ódio por cadeiras), o cibernético pirata Barba de Metal de Nick Offerman ("Difícil? Difícil é limpar sua bunda com uma mão de gancho!"), a enérgica Uni-Kitty de Alison Brie (sem consistência em nada do que faz) ou as pontas de personagens famosos (destaque para o Lanterna Verde: risível e ainda assim melhor que no seu próprio filme); se é a trilha sonora, a revelação (um tanto previsível) do final, ou a maneira genial em que o filme aproveita o fato de ser tudo de LEGO para sequências de ação impressionantes. 

Emmet e sua única ideia na vida: O sofá beliche. Não deixe que uma
ideia ruim mate todas as suas outras: até ela pode ter um uso um dia
E no meio de tudo isso, algumas mensagens importantes - Assim como uma ode a criatividade, temos aqui um hino contra o conformismo. A jornada de Emmet (Chris Pratt) não é só uma de heroismo indesejado, causado por um encontro fortuito com o destino (na forma da "peça de resistência); trata se de uma sobre pensar por si mesmo, reconhecer aquilo que faz de você único e especial, e viver em cima disso - e não "do que diz no manual de instruções". Sua obsessão por "seguir o manual" e ser "perfeitinho" faz dele um pária sem notar - afinal, Emmet não é ninguém; não tem nada que o destaque, que chame atenção, é só um "yes man" para tudo e todos. Nunca divergindo, nunca se destacando, nunca discordando - sempre em segundo plano. Tão genérico que nem em aparência tem algo especial: seu rosto é o das minifiguras genéricas, aquele sorrisinho : ) em uma cara amarela, que todos conhecem. 

Muito além de um rostinho bonito. 
E num reflexo de como originalidade é lentamente sufocada, não apenas Emmet vive em função de regras prontas (sem jamais pensar nos problemas óbvios de tudo que segue cegamente), como sua única ideia original (o sofá beliche) é afundada toda vez que é mencionada. Ao mesmo tempo, na relação com os mestres construtores (em especial Wildstyle - dublada por Elizabeth Banks, muito além de um interesse romântico), uma ressalva: fazer o que se vem em mente, sem planos e sem ordem alguma é uma garantia ao fracasso. 

Business e sua arma secreta: não podemos controlar o mundo.
No extremo oposto do problema, o Lord Business de Will Ferrel dá a outra parte da mensagem: não pense que a sua ordem, as suas ideias e a sua visão de mundo devam ser a dos outros - se a aderência cega do herói as regras era a única coisa que o definia, a ordem perfeita de Business é o que destrói a identidade de todos. Ao querer congelar tudo em "perfeição", não há espaço para ninguém além dele próprio - e mesmo ele torna-se uma nulidade sem ninguém para interagir. O mundo é feito de pessoas - cada uma especial e única a sua maneira, e força-las a deixar de serem assim para seguir um "modelo ideal" é o auge do egoísmo. 

"Eu só trabalho em preto. E as vezes em cinzas muito escuros"
LEGO Movie é um filme previsível nos seus aspectos macro - até a grande revelação do climax é óbvia prestando-se atenção nas "relíquias" de Lord Business (cada uma com uma piada genial na nomenclatura... Kra Gle, Sword of X-Act Zero, Polísh Remover of Ná-Ill...). E isso não é de maneira nenhuma uma coisa ruim. Não há qualquer pretensão de ser "sério e culto" aqui; a inocência não é um pecado, mas uma virtude do roteiro, algo a ser celebrado. Inocência que se nota também no arco romântico entre Wildstyle e Emmet (nunca caindo para a malícia) e na resolução singela do verdadeiro conflito do filme. 

Se você curte LEGO, se tem filhos, se teve uma infância e não se envergonha dela, ou se simplesmente gosta de bons filmes, LEGO Movie é certeiro; impossível não se encantar por sua história, pelo charme tolo, ou pela beleza das cenas "em LEGO", feitas em um misto de computação gráfica e retoques de stop motion (difíceis de serem separados, de tão fiel aos blocos que a animação é). Ainda mais impossível é sair do cinema sem aquele gostinho de "quero mais". Deveria servir como uma lição para outros estúdios; assim que se trata uma linha de brinquedos no cinema, sem vergonha do que ela é.

Nota: 10/10

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