Mas acompanhando de vista a manifestação aqui de Joinville junto com a minha namorada, uma surpresa mais do que agradável: vendo a passagem da manifestação do MPL, poucos sinais das pautas típicas da direita ou da alienação política que marcou a semana anterior. Apenas alguns perdidos "Podia estar matando, podia estar roubando, mas os políticos fizeram primeiro" (que carece de um problema a ser combatido) e um cartaz sobre algo ligado a "urna eletrônica ser fraude eleitoral", a velha pauta que surge todo período eleitoral - e que faz pouco sentido: implantada durante o regime de FHC, se a função da urna fosse roubar a eleição, jamais que Lula chegaria ao poder (ao menos que o sujeito insinuasse que era uma conspiração secreta do PT dentro do governo do PSDB - ou que durante o governo FHC a urna era honesta, mas depois passou a não ser, mas não vou me meter com teorias da conspiração aqui).
De resto, era apenas o MPL e a esquerda que sempre o apoiara - nada dos gritos de "sem partido", nada da cantoria do hino nacional, de "eu sou brasileiro com muito orgulho", das máscaras de Guy Fawkes e daquele estranho clima de carnaval (ou marcha cívica) que marcou a semana anterior. Ao invés de uma massa de 12 mil pessoas com uma miríade de pautas enfraquecidas, uma única pauta dando as caras com força. E que chegou ao ponto de ocupar o terminal urbano (pulando a catraca, e não na travessia com cara de marcha cívica da semana passada). Algo que não era visto desde que tivemos a população "se solidarizando" com os jovens do MPL depois que estes apanharam - e muito - naquela fatídica quinta-feira marcada pela violência contra tudo e todos por parte da PM de São Paulo.
Teríamos aí o retorno dos verdadeiros protestos? Pautas claras e pessoas politizadas nas ruas, ao invés da aura vaga e dos gritos fascistas de "sem partido" e o culto fervoroso a bandeira nacional - que culminaram no ódio violento às esquerdas, nas agressões contra militantes partidários, e em seu ponto máximo, casos como o incendiamento de bandeiras estaduais? Uma coisa é certa: a esquerda conseguiu virar o jogo e voltar a ter presença de fato nas ruas. E isso é uma coisa a ser admirada.
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O caos próximo ao Mineirão |
Com as significativas vitórias de algumas das pautas que poderiam levar a perda de forças das centenas de milhares (1,5 milhão, da última vez que acompanhei) que foram as ruas, alguns já se sentem vitoriosos: tivemos a queda da PEC 37 (embora nem tudo nela fosse ruim - mas a maior parte de fato era); A corrupção passará a ser crime hediondo (embora ninguém vá ser punido ainda pois a lei não pode retroagir...); Teremos uma reforma política considerável (mas quem a pedia agora diz que isso é golpe... e que não sabemos como será); tivemos uma proposta aprovada para reduzir o transporte coletivo em todo o país (se as empresas não se aproveitarem); e foram aprovados mais investimentos na saúde e na educação. Tudo isso é muito positivo - e desarma parte daquela sarna golpista que a direita mais radical insistia em coçar. E para fechar a virada, o ídolo da massa reacionária, Joaquim Barbosa, declarou seu apoio ao plano da Presidente de fazer a reforma por plebiscito. Uma bomba a menos, possivelmente.
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Manifestantes ocupam ônibus "cedidos" em Joinville |
Ainda temos gente propondo que se expulsem "os vermelhos" das ruas. A velha publicação reacionária ainda tenta acusar os partidos de esquerda de serem oportunistas e de tentarem "desacreditar a movimentação do povo" - quem entende sabe que publicação é. Ainda existe nas redes sociais a sugestão da queima das bandeiras partidárias, mas com menos reconhecimento da população em geral - felizmente, parece que voltamos a ter um dialogo político saudável nas ruas.
O temor de um golpe foi reduzido - talvez até exposto como ridículo - mas ainda não estamos exatamente livres. Mesmo com o relaxamento da onda, e a redução nos números dos direitistas tentando se apoderar das manifestações da esquerda, ainda vivemos uma situação tensa. E é claro, a retomada da esquerda foi em Joinville - no resto do país as coisas não foram tão tranquilas. Os números tem caído. As PMs tem retomado a repressão, e ainda é cedo para dizer se as medidas propostas pela presidente surtirão efeito em acalmar a população. Por ora, a coisa mais inteligente a se fazer é esperar para ver.
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E por favor: não façam mais isso. |
Assumam seu posicionamento político-ideológico, ao invés de gritar "sem partido" a cada bandeira vermelha encontrada - enquanto continuam a ignorar as faixas em apoio à "volta dos militares", pedindo "o fim da esquerda", ou clamando por Barbosa para presidente: todas essas pautas tem sim partido - toda pauta o tem. Se querem ir a luta, que lutem! Mas façam isso de maneira honesta, sem tomar a luta alheia para si e acusar aqueles que lutavam há anos de serem oportunistas. Se querem mostrar como suas bandeiras são a retidão e a integridade, demonstrem isso na prática.